“As regiões precisavam de mais autonomia administrativa e financeira”

Entrevista

06-07-2022

# tags: Porto e Norte de Portugal , Turismo , Turismo de Negócios

Melhor distribuição de turistas, esbater a sazonalidade e aumentar a estada média na região do Porto e Norte são alguns dos objetivos do mandato de Luís Pedro Martins, enquanto líder do Turismo do Porto e Norte de Portugal. E fica o compromisso de que o MICE vai ser uma grande aposta em 2022.

Como descreve o seu percurso até chegar ao Turismo do Porto e Norte de Portugal?

Estudei no ensino secundário numa escola de artes e acabei por me licenciar em Design, na Escola Superior de Artes e Design. Depois tirei uma pós-graduação em Marketing na Porto Business School. Aos 25 anos de idade surgiu a oportunidade de ir para a Assembleia da República. Já estava envolvido na política e juntei aqui as três coisas: a política, o design e o marketing. Estive em duas legislaturas como deputado e, mais tarde, como adjunto de um ministro. E porque tinha esta experiência, desde cedo comecei a realizar muitas campanhas de marketing político – fiz mais de 150! –, que me deram a possibilidade de conhecer bem o país. De regresso ao Porto, vou para responsável de comunicação e de marketing da Santa Casa da Misericórdia do Porto e aí contactei de perto com áreas mais relacionadas com o turismo, porque estive na criação do museu da Santa Casa. No meio desse processo, a Torre dos Clérigos entra em obras profundas e havia necessidade de, aquando da reabertura, se criar uma equipa muito profissional nesta área. Surgiu o convite e fui fazer a direção executiva da Torre. Iniciámos com 100 mil turistas e, quando saí, em 2018, só nesse ano tínhamos recebido 1 milhão e 100 mil turistas. Esse desafio deu-me a oportunidade de criar rigorosamente tudo de novo, desde o acolhimento, os sistemas de bilhética, a comunicação, a promoção externa, todo o trabalho de assessoria de imprensa, contacto com plataformas, desde o Getyourguide até ao Booking. Foram anos muito interessantes porque me aproximaram bastante da realidade do turismo na região e também fora da região.

Entretanto, surgiu a oportunidade de alguém avançar para a Entidade Regional de Turismo do Porto e Norte e, na perspetiva de quem fez o desafio, eu juntava algumas áreas interessantes, por um lado, o conhecimento bom do fenómeno turístico, por outro, a formação. As coisas começaram a correr bem, e surge a oportunidade, por parte da ATP [Associação de Turismo do Porto], de querer concretizar um sonho antigo, que era o de que a mesma pessoa presidisse às duas instituições, a exemplo do que já se fazia noutras regiões e com benefícios muito claros, nomeadamente nas áreas de promoção externa, comercialização, comunicação, marketing. E foi isso que fizemos.

Candidatei-me também à ATP, venci a eleição e fizemos aquilo que chamamos uma fusão funcional a partir desse momento. Administrativamente tem que haver na mesma as duas instituições, mas em termos funcionais juntamos as equipas de marketing, comunicação, promoção, comercialização, e achamos que tem sido um trabalho muito interessante.

O que é que gostava que ficasse como marca mais distintiva do seu atual mandato?

O que gostaria que fosse reconhecido era uma visão regional. Alguém que percebe que tem a sorte de ter a marca Porto na sua região, uma marca muitíssimo forte, a grande âncora da região, mas que coloca essa marca ao serviço de toda a região. Havia um desequilíbrio muito grande, e obviamente que ele irá existir sempre, uma vez que as portas de entrada na região se situam na área metropolitana do Porto, mas era preciso fazer mais. Era possível ajudar a que os outros subdestinos ganhassem mais com esta notoriedade que o Porto tinha. E isso era possível fazer desde que se começasse a investir mais em promoção desses territórios, que se levassem mais press e fam trips, e que se aproximassem também esses produtos das portas de entrada – até vendê‑los, se possível, nas lojas de turismo. Esse trabalho está a ser possível e deu frutos. A única coisa menos negativa que a pandemia trouxe foi colocar os holofotes nestes territórios, o que de certa forma acompanhou aquele que era o nosso desejo. Esse era o primeiro desafio: turistas mais bem distribuídos pela região. Segundo: conseguir esbater a sazonalidade. Isso é possível captando os turistas de mercados de longa distância e nomeadamente os que vêm em contraciclo, como o Brasil e os Estados Unidos, o que também estamos a fazer. E a terceira era aumentar a estada média.O que gostaria que resultasse daqui era uma região muito mais solidária entre ela, como já é hoje, e que conseguiu resolver três questões fundamentais: melhor distribuição de turistas, esbater a sazonalidade e aumentar a estada média.

Para fazer coisas é preciso dispor de um orçamento. Como é que olha para o financiamento que é dado ao Porto e Norte e como o compara com outras regiões?

O Turismo do Porto e Norte é composto pela Entidade Regional, em que o financiamento tem origem no orçamento de Estado, e pela Agência Regional, esta de natureza privada, que possui uma estrutura de financiamento com origem essencialmente nas quotas dos associados e na prestação de serviços, concretamente no acolhimento, comercialização e promoção turística dirigida ao segmento B2C. Temos um contrato-programa de promoção turística externa com o Turismo de Portugal, e também temos um contrato‑programa com o Município do Porto, uma vez que somos nós que fazemos todo o acolhimento e a promoção externa do Visit Porto. Depois, financiamo-nos também através de fundos comunitários, a que constantemente nos candidatamos.

Eu acho que este é um dos problemas a resolver pelo país. E nem vale a pena falar pelo Porto e Norte apenas, porque isto é transversal. Em boa verdade, para aquilo que nós fazemos, e para aquilo que nós poderemos fazer, o financiamento é muito escasso, muito reduzido. Ainda por cima porque esbarra com a lei 33, que nos tutela, que não nos dá nem autonomia administrativa, nem autonomia financeira. É altura do país perceber a força das suas marcas regionais, mas para isso tem de financiá‑las de forma diferente para que elas possam ter um trabalho ainda mais consistente. Percebendo-se também que são regiões muito alinhadas e muito solidárias com o Turismo de Portugal. O que haveria, com outro financiamento, era a possibilidade de fazer ainda mais e é a isso que nós permanentemente vamos apelando. Quando nos comparamos às regiões vizinhas, a diferença é absolutamente esmagadora entre aquilo que os meus colegas da Galiza ou Castela e Leão podem fazer e aquilo que nós podemos fazer. Por outro lado, seria importante, ao fazer esse trabalho, organizar o governance e saber quem pode fazer o quê.

Não tenho dúvidas nenhumas de que, em matéria de promoção externa, só duas marcas funcionam: a marca Portugal e depois a marca região. A partir daí é estar a espartilhar e estar a perder dinheiro.

E tem sido possível encontrar outras fontes de financiamento?

Não tem sido fácil, mas estamos a trabalhar agora muito próximo com a Comissão de Coordenação e Desenvolvimento da Região Norte (CCDR-N) e temos esperança de que o próximo Quadro Comunitário, que se estende até 2030, possa ajudar a resolver essa questão. Estamos a trabalhar com grande proximidade e a ideia é, desde que a CCDR-N assim o aceite -e as coisas estão a correr muitíssimo bem -, que nós possamos ser a entidade parceira da região e tudo o que seja turismo passe pela Entidade.

Aproveito para falar aqui de algo que é polémico e que tem vindo muitas das vezes à discussão, que é a integração do turismo nas CCDR. Acho que isso seria um erro. Não é necessário fazê-lo. Porque se há setor que está já regionalizado é o turismo, com a criação das entidades regionais. O que nós deveríamos explorar é um caminho de reforço das competências e dos orçamentos destas entidades e se, um dia -e eu espero que esse dia aconteça -, houver regionalização, se houver um governo regional, então aí é fácil, é só pegar nas entidades regionais, absorvê-las, e elas próprias já são, logo à partida, a pasta do turismo desse governo regional.


Aposta na promoção MICE

Quais são os grande eixos em termos de promoção, em particular para o segmento MICE? E todos recordamos uma campanha diferente, como é a da Ofelia…

2021 e 2022 são anos de aposta na promoção do MICE. Lançámos esse vídeo “The Majestic Adventures of Ofelia de Souza”, onde a ideia foi mostrar o novo Porto e Norte, onde a tradição e o contemporâneo se encontram, em perfeita simbiose, através de novos espaços para eventos, atividades, gastronomia, arte, design, pelos olhos desta meeting planner que é a Ofélia de Souza. Vimos muito do que existia em termos da promoção da meetings industry noutros territórios e percebemos que era quase tudo igual: mostravam as salas, os equipamentos. Então o briefing que nós passámos era de algo muito fora da caixa, que também mostrasse as salas, também mostrasse os espaços para eventos, mas que mostrasse muito mais. Que mostrasse o ambiente todo que se vive à volta disto. E acho que conseguimos. Aqui, parabéns à agência que trabalhou connosco, a Kobu. Conseguiu-se um filme muito disruptivo, contemporâneo, com um humor inteligente, e prova disso é que temos ganho muitos prémios internacionais.

Depois fizemos uma forte aposta em conteúdos digitais de suporte para event e incentive planners, tais como o ‘Porto e Norte Travel Series’, uma viagem com nove episódios na região através de um guia israelita, Gabo The Guide, onde quisemos explorar outras temáticas, o luxo, a moda, o lifestyle, os vinhos, a gastronomia, os city breaks. Depois temos aqui dois eventos muito interessantes: Meethology e Eventhology. O Meethology que procura dar a conhecer os grandes embaixadores e projetos da região na área da digitalização, economia circular, tecnologia, indústria, e depois o outro, o Eventhology, é um primeiro projeto ligado à área do gamification, em que os organizadores de eventos podem descobrir o território, escolher programas, escolher experiências num próximo evento fictício aqui no grande Porto e ajudar a criar de forma divertida alguma notoriedade à região. Estamos muito ligados a cidades como Porto, Braga, Guimarães, e temos captado muitos eventos para estes territórios. Destaco a conferência da Aito, que vai ser realizada em Braga, o Portugal in Love, o M&I Flagship Forum. São muitos...mas que nos permitem acreditar que vamos conseguir crescer neste ranking, onde o Porto e Norte não ocupava um lugar que correspondia àquilo que tem para oferecer. É esse o nosso trabalho.

Falou de Porto, Braga, Guimarães,...Há mais algum destino relevante para este segmento?

...Matosinhos, Vila Nova de Gaia, Santa Maria da Feira, estes são destinos para os quais podemos trabalhar a meetings industry. Depois, para conseguir comunicar tudo isto internacionalmente, não chegam apenas os filmes. E por isso estamos a apostar numa maior expansão e diversificação em redes internacionais, na contratação de Global Sales, e posso adiantar que estamos a dias de fechar a primeira contratação do Porto e Norte nesta matéria, que vai ser no Brasil. Gostávamos de, até ao final do ano, fechar uma outra, eventualmente no mercado europeu. A ideia é fazer uma aposta mais incisiva no produto da meetings industry, captar eventos, e depois também conseguir cruzar com outros produtos da região. Aliás, essa é sempre a nossa perspetiva: fazer cross‑selling. A rota dos vinhos e de enoturismo, os patrimónios UNESCO, o termalismo, a Rota do Românico, o que não faltam são possibilidades de cruzar esses produtos.

Para que isto tudo tenha sucesso é preciso trabalhar bem a questão da conectividade aérea. Temos voos de 108 cidades de todo o mundo, aproximadamente 20 companhias aéreas, planeamos muitas campanhas de marketing para promoção da região com várias companhias, como a Turkish, a United Airlines, a British Airways, a EasyJet, a Ryanair, entre outras. Precisamos muito de trabalhar a ligação a mercados estratégicos como o Brasil, ou como os Estados Unidos. Os mercados europeus, de certa forma, conseguimos resolvê-los com uma série de companhias que apostam forte no Porto e Norte. Estes mercados do Brasil e dos Estados Unidos estão mais dependentes da nossa companhia de bandeira, a TAP. Temos de conseguir trabalhar bem esta questão porque o mercado do Brasil, para terem ideia, é o quinto mercado do país, mas já era o terceiro do Porto e Norte em 2019.

Ainda no que diz respeito à captação de eventos, temos trabalhado muito com o Turismo de Portugal, no programa de apoio à realização de eventos, que permite uma majoração adicional a eventos híbridos, e onde o alojamento local já é contemplado na contagem das bed-nights, um apoio extraordinário e impulsionador face à fase de retoma de eventos. Era por isso importante falar neste Portugal Events.

E como vê o papel da TAP?

Em primeiro lugar, eu não ataco a TAP pela existência da TAP, ou pelo investimento que se faz na TAP. Sou dos que defendem que é importante uma companhia aérea de bandeira, que é importante e compreensível que a aposta principal seja feita no aeroporto de Lisboa, local onde a TAP tem o seu hub. À exceção da Alemanha, nenhum país consegue ter dois hubs. É por isso uma aposta compreensível no aeroporto de Lisboa. Não só é compreensível, como também defendo a existência desse hub. É importante, é estratégico para o país. Mais, defendemos e somos solidários com a construção urgente de um novo aeroporto. A não construção desse aeroporto poderá prejudicar em breve o país. O que nos custa é que, estando também nós a pagar esse esforço, não sejam depois dadas às regiões condições para que esta questão seja trabalhada da melhor forma. A operação da TAP em 2019 não era o que nós desejávamos. Compara-se com 2019, mas já em 2019 tínhamos capital de queixa porque achávamos que era preciso fazer mais. Se as outras companhias acreditam no Porto e Norte, acreditam que aqui há mercado -prova disso é que estão a crescer -, não há razão para que a nossa companhia de bandeira também não cresça. Mas se for uma questão de opção estratégica não crescer -sabendo nós o investimento que os cidadãos a Norte, e no Centro, e no Algarve, fazem para esta companhia -, não há dramas. Mas que tenhamos financiamentos para poder trabalhar com outras companhias. Acho que é só uma questão de tornarmos isto tudo claro. Temos uma infraestrutura aeroportuária excelente, que crescia 10% ao ano, com um mercado muito grande à volta, de cerca de 5 milhões de pessoas. O aeroporto serve o Porto e Norte, serve também o Centro e serve a Galiza.

Sente que faltam mais espaços para eventos na região?

Acho que estamos bem servidos. O nosso problema não é ter falta de espaços, o problema do Porto e Norte, às vezes, é o país acreditar que o Porto e Norte tem espaços para conseguir realizar grandes eventos.

O inquestionável sucesso turístico do Porto, da região, pode ser uma ameaça para determinados segmentos como a meetings industry, limitando a capacidade de resposta do destino para acolher eventos?

Não há ameaça nenhuma. O destino é capaz de continuar a gerir este sucesso. Felizmente o destino tem hoje uma grande capacidade hoteleira. Mais, durante a pandemia foram projetados ou estão em construção novos hotéis. O destino é reconhecido também pela qualidade das suas infraestruturas, consegue ter já alguma diversidade dos locais para receber eventos. Não têm de estar todos concentrados no Porto, já podem sair da área metropolitana. Braga já tem hotéis que vão dando resposta e está a construir mais. Por todo o território estão a surgir novos hotéis. Não considero essa uma questão, portanto. Além de que é preciso perceber que há aqui alguma lógica quando se definem as datas para estes eventos. Normalmente não são na época alta, o que nos permite fazer alguma gestão, porque quando diminui o lazer, temos oportunidade de receber os eventos de negócios.


Digitalização e sustentabilidade

Todos vivemos um processo de digitalização acelerada nestes últimos anos. Acha que a região está preparada para responder às necessidades?

Em primeiro lugar, a região está no mesmo nível das outras regiões do país. Eventualmente, nestas questões da digitalização, poderá até estar um pouco à frente, uma vez que aqui estão concentradas muitas das empresas ligadas às novas tecnologias e, neste caso, da digitalização. De qualquer forma, é um trabalho que estamos a fazer. Recordo que o Porto e Norte se candidatou à Agenda do PRT [Plano Reativar Turismo] para a digitalização e fazemos parte de um conjunto de grandes instituições que apresentaram uma candidatura num valor à volta dos 140 milhões de euros, julgo. Temos esta candidatura precisamente para resolver a questão da digitalização, e resolver até a montante, porque não interessa estar a dar ferramentas quando temos problemas como, por exemplo, terminar com as zonas brancas que existem na região, onde não há acesso sequer a telemóveis.

Depois, estamos a trabalhar a questão da sustentabilidade e da ecologia. Está a ser desenvolvido um selo para validação de boas práticas por parte da oferta turística do destino Porto e Norte. O projeto surge desta necessidade de acompanhar o que se tem vindo a fazer de mais atual sobre esta temática da sustentabilidade. Uma coisa muito clara: o Porto e Norte está a trabalhar a questão da sustentabilidade e ecologia, mas está a tentar trabalhála de uma forma muito profissional. Em primeiro lugar, identificar quem são os parceiros que nos podem ajudar a trilhar e a certificar este caminho. Não queremos dizer que somos sustentáveis porque sim, porque fica bem para atrair mercados e turistas. Queremos ser conhecidos como sustentáveis, mas para isso temos que ser verdadeiramente sustentáveis. Já há muitas empresas que fizeram este caminho, mas não chega, e isto é uma prioridade também do Porto e Norte. Com este esforço que estamos a fazer, e também com esta candidatura que fizemos ao PRT, que julgo que vai ser aprovada, temos condições para enfrentar o futuro sem problemas.

E acredita que este tema da sustentabilidade pode ser um bom argumento de vendas, ou de promoção do destino?

Acredito que este é O tema. As novas gerações, os millennials, a geração zero, são extremamente tecnológicas, é verdade, mas, paralelamente a isso, são as que mais se querem aproximar da natureza, de hábitos de vida saudável, e não perdoam um destino que não tenha estas questões resolvidas.

Já o ouvi falar muitas vezes da importância de trabalhar em rede. Como é possível envolver outras áreas, a Cultura, a Academia...de modo a poder trazer mais eventos para a região?

Eu só acredito neste trabalho de articulação com outros setores de atividade. Em primeiro lugar, o turismo já tem à partida uma vantagem: se há setor que provoca o arrastamento positivo de outros é este. Quando o turismo está bem, estão bem os têxteis, os produtos agrícolas, a pecuária, as loiças, a construção civil. Mas uma coisa é ele acontecer quase de forma natural, outra coisa é nós trabalharmos para que isso seja visto como um esforço que fazemos para trabalhar em conjunto. Curiosamente este trabalho que estamos a fazer com a CCDR-N tem muito este objetivo: conseguir cruzar o setor do turismo com outros setores. Aquilo que fazemos com a rota dos vinhos e do enoturismo. O que fazemos na área cultural com a rota do Românico ou com as novas rotas que estamos a criar de Arte Contemporânea, do turismo literário. Mas também o podemos ligar à indústria. O Porto e Norte faz parte do trabalho que o Turismo de Portugal está a fazer em termos de turismo industrial. E, de repente, 70% da oferta de turismo industrial deste primeiro conjunto que o Turismo de Portugal avançou está no Porto e Norte. Acredito muito que esse é o caminho. É possível fazer esse trabalho e captar eventos.

Em relação a captarem-se grandes eventos para a região, acho que o que falta às vezes é a vontade de resistir à tentação de centralizar os grandes eventos nos locais de sempre. Dito de outra forma, é sempre muito mais difícil ao Porto e Norte argumentar para trazer um grande evento para a região.

Como vê a cooperação entre o Porto e Norte e os outros destinos do país?

Também acreditamos muito nisso. Felizmente, vivemos num momento de grande articulação entre todas as regiões, e entre todas as regiões e o Turismo de Portugal. Aliás, aproveito para dizer que a prova disso é que conseguimos atravessar um período de grandes dificuldades, como foi a pandemia, e haver paz social neste setor. Isto só existiu porque houve, desde a Secretaria de Estado do Turismo, ao Turismo de Portugal, às Entidades Regionais, aos Municípios, às associações do setor, muito diálogo e muito trabalho. Por outro lado, eu e os meus colegas das outras regiões temos muito claro que não interessa nada a uma região ir sozinha, por exemplo, para o Brasil para se vender a um mercado tão grande, ou para os Estados Unidos, ou para o Canadá. Era perfeitamente insano alguém ter a veleidade de querer ir captar esse mercado sozinho. O que é que nós estamos a construir? Estamos a construir, também com o apoio do Turismo de Portugal, programas de promoção externa entre regiões. Por exemplo, o Porto e Norte, o Alentejo e o Centro estão neste momento a trabalhar várias ações de promoção externa, a serem feitas em conjunto. Com toda a lógica, primeiro, porque os mercados são muito semelhantes nestas três regiões, segundo, porque os produtos que temos a apresentar são muito semelhantes, e terceiro, o mercado é tão grande que dá para todos. Agora, indo unidos, ganhamos um bocadinho mais de escala. E também ajudamos a repartir despesas.

O que é que podemos esperar de interessante para o Porto e Norte com o PRR [Plano de Recuperação e Resiliência]?

O PRT, uma vez que o PRR não tem grande coisa, a não ser poder continuar a apoiar as empresas, que, muitas delas, não conseguiram recuperar ainda de dois anos de pandemia. Diria que o que nós temos de interessante para os próximos tempos é, em primeiro lugar, a capacidade da região poder receber grandes eventos internacionais. Por outro lado a capacidade da região conseguir resolver esta questão da conectividade aérea, uma vez que é fator crítico de sucesso. E depois a capacidade de poder trabalhar estas duas questões que também são fatores críticos de sucesso: a digitalização e a sustentabilidade. Permitam-me só meter aqui um outro projeto, o da famigerada linha do Douro, que, esse sim, pode ser PRR, e que ajudava a região, pelo menos na questão da mobilidade, e de uma mobilidade sustentável. E se não for resolvido agora, com o PRR, não acredito que vá ser resolvido algum dia. A linha do Douro poder ser apresentada ao mundo como o troço de linha férrea mais bonito do mundo tem agora a sua oportunidade.

O que é que retira como lição mais importante destes últimos anos de pandemia?

Que as regiões precisavam de mais autonomia administrativa e financeira. E isso em nada coloca em perigo a estratégia nacional e a sua relação com o país. E tiro também a lição, se dúvidas tivesse, que este é de facto um setor muito, muito resiliente, muito combativo. É um setor que mostrou estar unido e que tem empresários notáveis, que conseguiram atravessar este período sem atirar a toalha ao chão. E o país às vezes é injusto, porque pedir aos empresários que tenham as suas empresas ativas já não é fácil, mas nós todos pedimos muito mais, pedimos que estejam abertos, com a máxima operação e com os níveis de qualidade de serviço a que habituaram os turistas. Isto sim, é de uma exigência incrível. Quando o setor reclama que tem que ter um olhar muito atento por parte do governo, que tem que ter apoios, e que merece uma atenção proporcional ao peso que tem na economia nacional, é muito justo esse pedido. E por isso é que o setor não achou motivadora esta solução de orgânica governamental, em que aparentemente diminui um pouco a importância do turismo ao juntá-lo com outros dois setores, o comércio e os serviços, numa mesma Secretaria de Estado. Esperemos que não seja verdade. A boa notícia é que a pessoa que ficou com a pasta é uma pessoa do turismo, já era secretária de Estado do Turismo, e isso pode ser uma vantagem. Em boa verdade, acho que o setor do turismo já provou que merecia um outro estatuto, mesmo dentro da estrutura governamental. Muitos dos nossos concorrentes têm ministério e nós não conseguimos ter uma Secretaria de Estado. Mas acredito que por trás desta estratégia está se calhar um reforço das regiões, e aí poderá fazer algum sentido a Secretaria de Estado estar partilhada com outros setores de atividade.


Com Rui Ochôa

© Cláudia Coutinho de Sousa Redação