Pedro Lino: “O que faz um evento memorável é a emoção”

Entrevista

16-09-2025

# tags: Espetáculos , Eventos , Meetings Industry , Eventos corporativos

Pedro Lino é um nome incontornável na história recente do espetáculo em Portugal.

Da infância ligada ao desporto à descoberta da dança, passando pelo salto para a televisão nacional e pela construção de uma carreira multifacetada, a sua trajetória é feita de encontros, paixão e muita aprendizagem.

Numa conversa franca, Pedro Lino, diretor da PLW, recorda os momentos-chave que o levaram do palco à produção de eventos, revelando como cada experiência moldou o profissional que é hoje.

Como é que chegou ao mundo do espetáculo, da televisão. Como é que tudo se desenrolou até aí?

Começo a minha carreira ligado ao mundo do espetáculo como bailarino. Comecei a dançar no Porto, por acaso. Sempre estive ligado ao desporto, jogava futebol no Futebol Clube do Porto, depois basquete também no Porto, e até fui campeão regional. Mas aos 16, 17 anos, deixei o desporto. Nessa altura, pertencia a um rancho folclórico ligado à minha família, e uma professora de dança viu-me dançar folclore e convidou-me a assistir a uma aula de ballet. Tinha 17 anos e havia algum estigma de “ir para o ballet”, mas fui, gostei e fiquei. Foi assim que começou a minha ligação ao espetáculo. Depois criei um grupo com outros bailarinos, o Andança, e fizemos o nosso primeiro espetáculo profissional no Coliseu do Porto em 1989. A partir daí, comecei a fazer muitos espetáculos, era o único rapaz e havia sempre muito pedido para homens, até que, em 1994, surgiu uma audição para um programa de televisão, o “Um, Dois, Três”, na RTP. Fui escolhido e foi como ganhar o Euromilhões artístico.

E essa mudança de vida para Lisboa, como é que foi?

Foi radical. Eu quase nunca tinha saído do Porto. Fui viver primeiro para Sesimbra, depois para o Bairro Alto, em Lisboa. Tinha um ordenado muito bom, ginásio, massagem, acompanhamento fisioterapêutico. É uma pena hoje, aos meus bailarinos, eu não conseguir equipará-los a esta altura... Este é o segundo momento importante, ir para Lisboa com a mentalidade de ser uma esponja. Não queria só dançar num programa de televisão, queria tirar o máximo partido de tudo. No início, oferecia-me para treinar os jogos dos casais, ficava mais horas, mas queria aprender. Fiz amizades incríveis, toda a gente me protegeu. Foi uma autêntica licenciatura/estágio em televisão…

Nessa altura, não havia tentações que o podiam desviar do rumo?

Era fácil poder ter-me perdido, claro. Estava no Bairro Alto, no centro de tudo. Mas a educação que tive ajudou muito. Divertia-me, mas tinha cabeça. Nunca me faltou nada e todos me acolheram. Foi uma fase maravilhosa.

Quando é que começou a olhar mais para a produção e direção de cena?

Desde cedo percebi que a vida de bailarino tem um prazo. A partir dos 35, a dançar ao nível que eu queria, já não seria possível. Fui começando a preparar o futuro e a criar várias possibilidades: trabalhei em teatro de revista com o Fernando Mendes, espetáculos com o António Sala, pertenci a uma boys band, os A4. Depois conheci o Luís de Matos, que me convidou para coreografar e apoiar na televisão e nos espetáculos corporate - e é o primeiro contacto que tenho com o corporativo, ele é muito bom a fazer isso. Trabalhar com o Luís foi outra licenciatura: rigor, empenho, busca da perfeição, espírito de grupo, camaradagem. E aqui estou a piscar cada vez mais o olho à produção.

Ao mesmo tempo, comecei a trabalhar com o Futebol Clube do Porto, primeiro em festas de campeão, depois nas apresentações de época. Eles foram muito inovadores, faziam espetáculos com som, pirotecnia, bailarinos no relvado e eu fui entrando no mundo dos eventos para grandes massas em estádios de futebol. Quando foi a altura do Euro 2004, eu tinha uma colaboração com a Realizar, uma agência muito forte, e fiz trabalhos com eles durante anos, incluindo as inaugurações de alguns dos estádios. Em 2005 passei a ser diretor de cena do Futebol Clube do Porto, uma grande inovação na altura.

Foi nessa altura que decidiu criar empresa?

Ainda não. Podia ter criado há 25 anos e teria ganho muito mais dinheiro, porque eram anos com budgets muito altos, inaugurações, mas nunca tive essa ambição de “um dia ter um Ferrari”. Eu queria era ser feliz, ter tempo para os meus amigos e família. Não tenho metas de budget, vou sempre de coração aberto. A empresa acabou por nascer de uma necessidade de estrutura. Sempre fui freelancer, nunca fui funcionário de ninguém. Só depois criei a minha empresa.


Os maiores desafios

Como era gerir a confidencialidade nos bastidores, sobretudo no futebol?

O futebol é um meio muito particular. Eu tenho muito cuidado com redes sociais. Tenho acesso a zonas reservadas e há uma confiança muito grande por parte dos clientes. Hoje em dia, há quase uma pornografia das redes sociais. Eu não me sinto bem a publicitar trabalho que é de alguém que me está a pagar. Outra coisa é uma produção minha. Prefiro viver assim.

Entre tantos projetos, qual foi o mais desafiante?

São muitos. As “7 Maravilhas” foi um deles. Os trabalhos com o Luís de Matos, como o espetáculo no Pavilhão de Portugal, o Campeonato do Mundo de Magia, no CCB, em Angola, a CAN, o encerramento dos Jogos Olímpicos de Inverno da Juventude, em Innsbruck. Os eventos de campeão no Futebol Clube do Porto também são sempre muito intensos. E também a Gala de Abertura de Matosinhos Cidade Europeia do Desporto, mais recentemente.

Quem foram as suas referências nesta área?

Eu sou muito pouco de ídolos. Não tenho fotografias com jogadores, nem camisolas assinadas. Mas tenho referências como o Luís de Matos, que me marcou muito no rigor. Várias pessoas com quem trabalhei na Realizar. O Joaquim Melo na parte da pirotecnia, Pedro Cabral na luz, que é um desenhador, um pintor de luz e que faz coisas brilhantes.

E no meio disto tudo, onde é que se sente mais feliz?

Em todos os eventos que integrem algo artístico, isso já percebi... Sou muito pouco corporate, é uma lacuna. Gosto, acho que até tinha algum jeito, mas a parte artística é o que me dá prazer. Mesmo em galas, numa abertura, tento sempre meter bailarinos, cantores, orquestras. Cada vez é mais difícil ter orquestras, mas tento sempre. Congressos médicos, por exemplo, não são a minha praia.

Os clientes valorizam essa parte artística?

Acho que agora valorizam mais. Houve uma altura em que se perdeu isso, mas hoje valorizam o artista que vai, perguntam mais quem vai cantar, quem vai atuar. Isso anima-me. É difícil para um artista viver sem ter de dar aulas e é uma pena, porque o Porto, em termos artísticos, é um viveiro único. Sai daqui gente com muita qualidade.

Nas produções de grande escala, o que é mais desafiante?

As equipas… até ao dia do evento. Até encontrar o rumo certo do evento é difícil. E, depois, a fase entre o fim da produção e o dia do evento: esse momento de pressão máxima. Há momentos de pressão muito grande, mas, quando chega o dia, sinto uma grande calma, porque sei que o trabalho foi bem feito. Sou muito intenso, mas consigo transmitir muita calma às pessoas, porque estou mesmo confiante no trabalho.

A importância da emoção

Como vê a evolução da indústria dos eventos em Portugal?

Melhorou muito em organização e profissionalismo. Mas também está tudo demasiado formatado, demasiado empresarial. Há pouca criação artística. Vejo muitos copy-paste e fico triste. Acho que as empresas deviam ter um diretor artístico a pensar em experiência únicas. Se fizermos mais do mesmo, alguém vai fazer melhor do que nós, ou a inteligência artificial ainda melhor.

E ao nível dos fornecedores e parceiros?

Estamos muito melhor, muito mais profissionais. Já competimos com o que se faz lá fora. Ao nível do futebol, então, estamos ao mesmo nível de qualquer país europeu.

Que projeto, nestes 15 anos de PLW, mais o desafiou?

Todos os projetos. Há uma entrega muito pessoal em todos. Crio ligações com os meus colaboradores, com os meus clientes, com toda a gente. Temos feito coisas que me orgulham muito. Mas a melhor recompensa é ouvir a reação de 60 mil pessoas no estádio. É uma sensação única esse “uau” coletivo. Ou quando um figurante vem ter comigo a dizer que adorou. Isso marca muito.

É isso que faz um evento memorável? A emoção?

Sem sombra de dúvida. Se as pessoas não tiverem este momento, seja em que evento for, inclusive corporate, de respirarem fundo e dizerem: ‘surpreenderam-me’, então não chegamos lá. Felizmente, ao longo destes 15 anos, como trabalhamos muito o futebol e eventos de massa, temos tido essas reações.

O que é que ainda lhe falta concretizar?

Não tenho um sonho específico. Já fizemos coisas tão grandes que vai ser difícil repetir. Hoje em dia, são outros tempos. Os anos 2000 a 2005 foram a loucura total, Portugal estava muito pujante e houve eventos muito grandes. A minha missão é melhorar todos os trabalhos e acrescentar sempre algo.

Os eventos do futuro vão ser mais imersivos e tecnológicos?

Espero que sejam mais humanos, com emoção. Mas também sou um apaixonado por tecnologia, adoro a junção entre a tecnologia e a parte artística. Imagino robôs a dançar com humanos num espetáculo. Acho que o futuro passa por aí: essa fusão entre tecnologia e humanidade.

Que conselho daria a quem quer começar?

Serem esponjas. Estarem atentos, observarem muito, absorverem tudo. Estarem no momento certo. E duvidarem. E experimentarem. São os melhores conselhos que posso dar.

Como vê as novas gerações que entram nos eventos?

Tenho alguma preocupação. Têm muito know-how, os que forem ‘finos’ vão singrar, mas falta raça a alguns. E falta o setor organizar-se para dar melhores condições. Precisamos de tabelas de preços mínimas, de mais profissionalismo. Temos de dar esse passo. É uma pena ver tanto talento desperdiçado.