Alimentos na última fronteira

18-05-2017

A exploração espacial tem sido, desde o início, sinónimo da mais alta tecnologia.

A exploração espacial tem sido, desde o início, sinónimo da mais alta tecnologia. Não há nenhum ambiente mais hostil à vida do que o vácuo no espaço, e contudo nós vamos até lá. E, quando ali permanecemos, precisamos de comer. Curiosamente, os avanços tecnológicos necessários para os alimentos funcionarem no espaço podem ter benefícios excepcionais para a nossa alimentação aqui na Terra.

Bioquímica nutricional

O departamento de bioquímica nutricional da NASA está encarregado de garantir que os astronautas satisfazem as exigências nutricionais da vida no espaço. Nas suas próprias palavras, eles desenvolvem "contramedidas" para neutralizar os efeitos negativos do vôo espacial sobre o corpo humano. Escusado será dizer que há um monte deles, e a equipa de bioquímica nutricional precisa por isso de resolver um grande número de problemas com recursos limitados. Fornecer os nutrientes adequados da forma mais eficiente possível leva a soluções criativas e inovadoras que têm implicações terrestres para coisas como o tratamento da doença óssea ou a distrofia muscular, bem como usos significativamente mais mundanos, como uma aplicação que rastreia com precisão a ingestão de nutrientes.

Sistemas de alimentação espacial

Uma vez que a equipa de bioquímica nutricional descubra o 'quê', a de sistemas de alimentos espaciais começa a lidar com o 'como'. Dado que a estação espacial não tem acesso à refrigeração de alimentos, é necessário que eles estejam 'estáveis em prateleira', ou seja, devem ser mantidos à temperatura ambiente por um longo período de tempo. Os alimentos, aliás, dividem‑se em quatro categorias com base no método de preparação e embalagem.

Reidratáveis

De macarrão com queijo aos cereais, só precisamos de adicionar água. Os alimentos reidratáveis são embalados num material flexível com velcro na parte inferior para ajudar a segurá‑lo ao tabuleiro de refeição e uma tampa no topo para a água. Uma vez preparados, são cortados com uma tesoura especial.

Termoestáveis

A maioria das frutas e peixes, bem como alguns tipos de carne, são tratados termicamente para matar as bactérias. Os alimentos termoestáveis só requerem que os astronautas os aqueçam antes do consumo. A embalagem é hermeticamente selada e requer tesoura para abrir.

Irradiados

É um nome assustador, mas o efeito é essencialmente idêntico ao anterior. Os produtos de carne são às vezes irradiados em vez de aquecidos para matar microrganismos e enzimas prejudiciais. São também mantidos em embalagens flexíveis.

Naturais

Frutos secos, barras de granola, biscoitos e alimentos similares estão prontos para comer, e os astronautas só têm de cortar a embalagem de plástico transparente com as suas tesouras especiais.

Cozinhar na EEI (Estação Espacial Internacional)

Receita de molho de pão de milho

Os astronautas na EEI comemoraram o Dia de Acção de Graças ao estilo espacial, com uma receita de molho de pão de milho directamente da cozinha da NASA.

Ingredientes:

12 chávenas de miolo pão de milho
3 3/4 chávenas de caldo de galinha
2 1/2 chávenas de cebola picada
1 1/2 chávenas de aipo picado
1/4 chávena de manteiga sem sal
3/4 colher de chá de sal
1 1/4 colher de chá de tempero de aves
1/2 colher de chá de pimenta preta
2 colheres de chá de salsa desidratada
1 colher de chá de salva

Preparação:

• Pré‑aqueça o forno de convecção a 160° C. O forno convencional deve ser aquecido a 180° C.
• Barre com manteiga uma assadeira de 33x23 cm.
• Descasque as cebolas e reduza‑as a puré num processador de alimentos. Coloque num recipiente e reserve.
• Pique o aipo de forma fina no processador. Adicione ao puré de cebola. Reserve.
• Aqueça uma frigideira em fogo médio. Derreta a manteiga e salteie a mistura de cebola e aipo até amolecer (cerca de 5 minutos).
• Adicione ao miolo de pão de milho previamente preparado. Misture bem. Num recipiente à parte misture o sal, o tempero de aves, a pimenta preta, a salsa e a salva.
• Junte à mistura salteada.
• Adicione o caldo de galinha. Misture bem. Disponha o preparado com uma colher na assadeira preparada.
• Leve ao forno durante aproximadamente 35 minutos a 160° C ou 180° C, dependendo do forno.

Preparação em voo espacial:

O molho saído do forno é transferido para uma bandeja de metal e liofilizado. Uma porção de molho de milho deve pesar aproximadamente 145 g antes da liofilização e 50 g após a liofilização.

Comer no espaço

A microgravidade na Estação Espacial Internacional traz um conjunto próprio de desafios quando se trata de preparar e comer refeições. Além de ter que confiar unicamente na tensão superficial para manter os alimentos a flutuar, os astronautas também têm de lidar com as diferenças fisiológicas. Coisas como o deslocamento de fluidos nos corpos podem afectar o olfacto e o paladar. Além disso, os aromas usuais que acompanham os alimentos são menos pronunciados no espaço, pois o ar quente não sobe imediatamente, levando os aromas às narinas, e também porque eles são forçados a comer de pequenas embalagens que confinam ainda mais qualquer cheiro. Combinar diferentes alimentos também é quase impossível, porque geralmente não há lugar para misturar nada, e é preciso um esforço concertado para manter vários pacotes abertos seguros e acessíveis. Alimentos a voar poderiam rapidamente resultar em desastre num ambiente como o da EEI, com tantas máquinas delicadas expostas. Uma migalha perdida poderia rapidamente pôr em causa os trabalhos ou perturbar a instrumentação sensível. E aí teríamos o caldo entornado.


Texto original (adaptado): Jelle Steenbergen | Fotos: ESA/NASA

A rubrica Food Inspiration é uma parceria entre a revista Food Inspiration e a Event Point.

Pode consultá‑la online em: www.international.foodinspiration.com