António Paraíso: “Sou obsessivo nos detalhes”

12-02-2019

Chegou antes da hora marcada para a entrevista, impecavelmente vestido. Conversámos por mais de uma hora.

António Paraíso é um especialista em marcas de luxo, em comércio internacional, e é frequentemente convidado como orador para eventos em Portugal e no estrangeiro, onde reflecte estes e outros temas, sempre em busca de inspirar as pessoas.

Pedem-lhe frequentemente para falar de marketing emocional. Como fazer com que a venda seja uma experiência marcante para o cliente? “O meu objectivo é sobretudo inspirar as pessoas, fazer com que elas chorem e riem, ou fiquem pelo menos com um brilho nos olhos. E há muita coisa que se pode fazer para dinamizar um negócio”. Também sucede a Lexus ou o BNP Paribas chamarem-no para um evento privado, só para clientes especiais ou funcionários de topo, para lhes falar de inovação ou de como os mercados podem evoluir, identificando tendências no segmento de luxo, mas não apenas aí.

Gosta muito de ler, de aprender, e todos os anos, para se manter actualizado, vai às melhores conferências da área em Nova Iorque, Madrid, Paris, Nova Iorque ou Londres. “O Financial Times organiza todos os anos uma conferência sobre luxo para 400 pessoas de todo o mundo, e eu sou uma dessas pessoas. Estão lá representantes da Vuitton, da Gucci, da American Express, para debater as últimas tendências e estratégias das marcas de luxo. E eu vou lá beber isso tudo, para trazer inspiração para os meus clientes”, descreve António Paraíso.

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Repetição, repetição

Paraíso confessa ter alguns cuidados com a voz. Treina em frente ao espelho, e às vezes as coisas não saem à primeira: “António, tens que sussurrar; elevar o tom de voz; imprimir mais determinação...” E trabalha as expressões corporais. “Eu salto para o meio da plateia e falo olhos nos olhos com as pessoas que estão a assistir. Falo muito com as mãos, agacho-me”. É um processo demorado.

Mas primeiro estica-se no sofá a pensar. “Gosto de pensar. Encontrar um fio condutor. Vou entrar em palco e começo a contar uma história, passo um vídeo, uma música? Já fiz tudo isso. Numa conferência em Singapura, quando anunciaram o meu nome, baixaram as luzes, e durante três minutos ouviu-se uma ária de ópera – uma coisa de arrepiar. E quando terminou a ária, um feixe de luz rasgou a escuridão, e apareci eu. Num teatro, já entrei pela plateia, pela fila central, deixando o palco vazio. Só se ouvia a minha voz, no princípio, e o palco continuava vazio… Depois de encontrar o fio condutor, vou ter que o preencher: para este guião ficaria bem este vídeo. Se já o conheço, vou buscá-lo imediatamente, caso contrário passo horas no Google, no Youtube, à procura do vídeo certo”. Vê toneladas de vídeos. E é assim que vai construindo a apresentação.

“Depois penso também nas minhas experiências de vida, que se cruzam com o tema em causa. Tenho montes de histórias engraçadas, até já fui preso em Copenhaga, por engano, porque me confundiram com um traficante marroquino (sorriso). Depois de ter a apresentação completa, faço no mínimo duas repetições, em casa”. “Levo isto muito a sério, e não faço duas palestras iguais. Há pessoas que me abordam e dizem, “Já o vi duas ou três vezes, e surpreende sempre””.

É fluente em português, inglês e espanhol, embora também fale alemão e francês. “Vivi e estudei em Londres e em Madrid, e isso ajudou. Porque não é apenas uma questão de pronúncia: eu digo as coisas como eles dizem, o que é uma vantagem”.

O maior pânico da vida de palestrante já foi há alguns anos, quatro ou cinco, e por isso era mais verde. Mas apesar de tudo correu bem. Foi para uma cadeia de lojas muito conhecida em Portugal, num evento em Dezembro, que reunia os donos, os administradores, todos os principais responsáveis, durante um fim-de-semana num hotel. “Demorei dias a preparar a minha apresentação, com muito cuidado – sou obsessivo nos detalhes. Estava espectacular! Preparei a bagagem toda para a viagem, saio de casa, faço os 300 quilómetros, e quando chego, começo a tirar tudo do carro, e não tinha trazido a pasta do computador. Não podia voltar para trás, a minha palestra ia ser dali a duas horas”. Durante 10 minutos entrou em pânico, mesmo. “Subi ao meu quarto, e decidi fazer tudo de improviso. O facto de ter dedicado tanto tempo à apresentação permitiu-me recuperar as ideias que queria transmitir. Aos poucos fui escrevendo as ideias-chave que estavam naqueles slides. Perdeu-se a música, os vídeos, tive que dar mais ainda de mim, numa palestra super impactante. Fui mais teatral, para puxar pelas pessoas, arrancar gargalhadas, contar episódios mais dramáticos, deixando algumas com lágrimas nos olhos. Eu sei como gerir as emoções da plateia… Mas aqueles 10 minutos em que fiquei em pânico foram muito difíceis, os mais difíceis de sempre”.

E onde se emocionou mais a fazer uma conferência? “Em Singapura”, responde sem hesitações. “Ainda hoje me belisco: como é que fui fazer uma palestra a Singapura?! Muitas vezes conto esta história para inspirar os outros. Toda a minha comunicação, a minha presença nas redes sociais, as apresentações, os vídeos, tudo é gerido por mim, para que possa ser encontrado. É um trabalho contínuo, exigente. Um dia, há uns quatro anos, recebi um email da Procter & Gamble, explicando que gostaram das coisas que viram sobre mim, e que gostavam que eu desse uma palestra em Singapura para 300 directores da Ásia-Pacífico, sobre como seduzir o consumidor de luxo, a pensar nos milionários que habitam naquela região do globo. Queriam saber as condições, tudo isso. Eu até pensei que era uma brincadeira de algum amigo. Nem respondi. Passados dois ou três dias, eles insistiram, dizendo que precisavam mesmo de saber se eu estava disponível porque, caso contrário, tinham que encontrar outro orador. E só aí eu percebi que aquilo era mesmo verdade. Resumindo, fizemos duas conference calls, e acertámos a minha ida a Singapura”.

“Mas o sítio mais emocionante, e devo ter sido o primeiro orador a falar num sítio assim, resulta do projecto do arquitecto Manuel Vieira, chamado Casa em Movimento. Um projecto com espaço para umas 60 pessoas, que é um protótipo de uma casa que está assente num sistema hidráulico, que roda, como um girassol, acompanhando o movimento do sol. E eu acho que fui o primeiro speaker que fez uma palestra dirigida a arquitectos numa casa em movimento. Ao longo da manhã a casa foi rodando lentamente, alterando o cenário que podíamos observar da janela. E, por isso, esse terá sido o sítio mais surpreendente onde já falei”.

Derradeira ambição

Confessa ter uma ambição muito grande, que é trabalhar o sector da hotelaria de luxo, lá fora. “E como sou muito persistente, gostava de fazer uma grande palestra, num evento de uma grande marca, de uma grande cadeia hoteleira, num evento internacional, sobre as ideias que tenho para esse sector. E um dia vou fazer essa palestra”, garante António Paraíso.