Criar tempo, um evento (im)possível

07-05-2018

A opinião da consultora Sandra Dias.

Os Profissionais Organizadores de Eventos são sobejamente (re)conhecidos e cortejados pela sua capacidade criativa, transformando simples ideias em momentos experienciais de júbilo e memória, criando valor para os seus clientes, parceiros, fornecedores, colaboradores e profissionais com quem se relacionam.

São, muitas vezes, confundidos com personagens das séries de aventuras e fantasia, pois, nos nossos pressupostos, estão sempre a fervilhar criatividade e magia ao transformar simples espaços em cenários plenos de estórias. Criaram-se mitos de que estão sempre cheios de energia, que não dormem, que não precisam de se alimentar e que conseguem fazer truques e ilusionismos e, no limite, todas as espécies de milagres. E neste fantástico panorama, simbolicamente concebido, o tempo é apenas um detalhe que, obviamente, faz parte do seu kit de magia. E pensamos que vão criar tempo a partir de uma varinha mágica ou da cartola de onde sai o coelho.

Mas a verdade é que, por muitos dotes criativos que os profissionais do sector de eventos tenham, por muitas hard e soft skills que tenham adquirido e desenvolvido ao abrigo da experiência e aprendizagem, o tempo é uma dimensão impossível de criar – 60 minutos serão sempre 60 minutos, independentemente de muita atitude e flexibilidade que o profissional tenha.

Nem de propósito, nos resultados do questionário, realizado por Cristina Fernandes e Susana de Salazar Casanova, sobre o sector, e que a Event Point publicou, a dimensão do tempo foi aflorada com as inerentes consequências que se revelam pela sua pressionada gestão. Cada vez se diminuem mais os prazos entre pedido e concepção de proposta, e cada vez é mais curto o tempo entre a adjudicação e a parte operacional.

Esta arriscada opção estratégica tem um custo invisível no sector, causando um desgaste físico e emocional nos profissionais. O burnout – de que se fala tanto nos dias de hoje – será, provavelmente, uma realidade em crescendo neste sector, que requer uma energia vital acima da média, foco, rigor e concentração, no sentido de que a qualidade seja de excelência e que o risco seja sempre controlado. Nos eventos existem ensaios gerais, mas no dia o ensaio terminou, e a magia é apenas o resultado do esforço, dedicação e zelo dos profissionais envolvidos.

A qualidade depende, proporcionalmente, da participação de todos. Falamos, muitas vezes, de fidelizar clientes, considerando que são estes players que permitem à empresa manter e prosperar o seu negócio. O paradigma pode, contudo, ser também equacionado de uma outra perspectiva, permitindo-se fidelizar fornecedores. Afinal, são eles que, também, permitem manter e prosperar os negócios dos seus pares.

Face à satisfação pelo trabalho de uma empresa de eventos, que garante aos seus clientes um serviço híbrido de qualidade, excelência, inovação e criatividade, o foco poderia centrar-se em reconhecer e fidelizar. De alguma forma, estimar e defender estes preciosos profissionais de um desgaste desnecessário relacionado com prazos apertados e, por vezes, inatingíveis. Em suma, permitir que a energia e o tempo dos profissionais estivessem aplicados em conceber e operacionalizar o conceito criativo, gerando inputs diferenciadores.

É, de facto, uma questão de opção eleger tempo de qualidade versus tempo de compressão. Em ambas as opções residem consequências. Há quem considere que os profissionais de eventos trabalham melhor sob pressão, que isso impele a sua energia criativa. Considerando que trabalham em pressão non stop pela responsabilidade de que corra tudo bem, alivie-se a sua carga na dimensão do tempo.

 

Sandra Dias, consultora e formadora