“Faltam cadeias internacionais em Portugal”

06-02-2018

A vice presidente da Associação Portuguesa de Agências de Viagens e Turismo (APAVT), Eduarda Neves, que falou à Event Point em Macau, durante o congresso da entidade, teme a concorrência de outros destinos e fala em “desigualdade” fiscal para os DMC.

Qual o principal desafio para o sector?

É a desigualdade de tratamento fiscal, os DMC, no fundo, são exportadores, mas não são tratados como tal e, quando comparamos com destinos concorrentes, a desigualdade é brutal, dentro da Europa.

O que é que a APAVT está a fazer para proteger os DMC?

A APAVT está há bastante tempo a tentar negociar com as entidades competentes, neste caso com a secretaria de Estado do Turismo e com a Autoridade Tributária, de forma a conseguir chegar à igualdade fiscal dentro do contexto Europa.

E que mercados ameaçam mais os DMC portugueses?

Todos. A nível da Europa é Espanha, Itália, Alemanha, Inglaterra, etc.

Como é que pode resolver alguma tensão entre a área do turismo de lazer e de negócios, nomeadamente no alojamento?

Não existe tensão, o que existe é alguma dificuldade em encontrar espaço na hotelaria. Nós temos, na minha opinião e na dos DMC, falta de outro tipo de hotéis mais virados para este segmento, no fundo considerado de luxo, como cadeias internacionais. Era preciso mais cadeias destas em Lisboa, Porto e em todo o lado. Quando um cliente está a escolher um destino para levar um incentivo e começa a olhar para as cadeias hoteleiras que existem e vê Barcelona onde existe tudo quanto há... Nós temos um Ritz Carlton e um Four Seasons, Istambul tem dois Four Seasons, tem Jumeirah, tem tudo e mais alguma coisa. E um dia destes a Turquia vai abrir outra vez e vai desviar grande parte do negócio que temos em Portugal, não só para lá mas também para outros destinos.

E o que é que se pode fazer para atrair essas cadeias para Portugal?

Eu não sei o que se pode fazer, tenho alguma ideia sobre as razões pelas quais não vêm para Portugal, mas não depende de nós. Há muitas cadeias que têm procurado espaço em Lisboa e não têm encontrado. Se calhar há alguma pressão para que não encontrem.

Acha que instrumentos como o fundo de congressos estão a funcionar ou precisávamos de algo diferente?

Acho que precisávamos em certos aspectos de um Simplex. Por cada jantar que tem animação tenho que pedir uma licença de ruído à Câmara. Para pedir essa licença tenho que mandar uma pessoa pessoalmente a um departamento da autarquia com um papel assinado por mim, porque sou eu a única pessoa que autorizo a empresa e pagar o pedido de licença. Depois quando recebe informação de que há resposta tem que ir buscar a licença ou não porque às vezes chega lá e dizem que afinal não precisava. Mas já a pagamos e tivemos que disponibilizar uma pessoa, durante uma série de horas, para lá ir.

Têm falado com as autoridades sobre esta questão?

Isto tem a ver com o funcionamento da Câmara e aliás neste ponto há outra questão que é grave. A autarquia decidiu que não seria mais possível circular com autocarros de 50 lugares em determinadas zonas de Lisboa, de um dia para o outro. Uma delas é o eixo Cais do Sodré – Largo do Rato, onde estão concentrados uma série de restaurantes que são usados tanto pelo segmento de MI, como de lazer. Há milhares de pessoas a jantar todos os dias naquela zona e o que a Câmara exige é que os autocarros não tenham mais de 10 metros e um de 50 lugares tem 12 metros. Ou seja para levar um grupo de 50 pessoas temos que deixar de ter lá um autocarro de 12 metros e levar dois de 10 metros, ou seja 20 metros. Desde que isso saiu, a APAVT tem estado em conversações com a Câmara e todos percebemos que há grandes dificuldades de trânsito nas zonas históricas de Lisboa, mas não é desta forma que se faz. Temos contratos assinados com anos de distância, acabamos por ter que compensar o cliente e não há alternativa. Não há carrinhas no mercado. Quem está sentado num gabinete decide, mas depois não tem contacto com a vida real. No Porto há também algumas restrições, no entanto houve uma negociação antes de decidirem proibir. Em Lisboa não, foi feita uma apresentação. Agora já há mais abertura, graças aos esforços da APAVT, porque muitos de nós estávamos em risco de fechar a porta. Só o nível de compensações que íamos pagar a clientes iam fazer com que muitas das empresas desaparecessem e isso implica desemprego.

Apesar disso Portugal está a acompanhar as exigências do aumento do turismo?

É evidente que há problemas, Lisboa é uma cidade pequena, a zona histórica é para onde toda a gente quer ir. Há estatísticas sobre isso, há uma percentagem mínima de turistas que vêm, por exemplo, ao Parque das Nações. Isso provoca uma série de problemas, mas para encontrar soluções temos que falar todos uns com os outros.

A Secretária de Estado do Turismo falou em descentralização também nesta área dos eventos e congressos. Acha que isso faz sentido?

Desde que as infra‑estruturas existam, bem como o transporte, que é essencial, tudo é possível. Até há alguns anos a minha empresa fazia mais conferências e congressos no Algarve do que em Lisboa, até porque o Algarve em termos de salas de reuniões tem muito melhor infra‑estrutura do que Lisboa. Hoje em dia é ao contrário. O transporte aéreo mudou do dia para a noite no Algarve, no Porto a mesma coisa. Tudo se faz, mas é preciso que se lá chegue e se nos outros destinos existe transporte aéreo directo como é que queremos ter os cliente fora dos grandes centros se não há transporte directo, ou se é dificultado com um transfer de aeroporto de duas ou três horas? Há clientes que querem, mas não é a maioria.

E esta questão de levar eventos para os locais dos incêndios parece‑lhe que faz sentido?

Nós estamos bastante envolvidos com o Centro e vamos continuar a dar todo o apoio, mas não tanto ao nível de eventos porque o tipo de infra‑estrutura que existe pede mais um cliente do tipo individual, para uma experiência diferente, que quer estar uns dias fora dos grandes centros. Para o tipo de grupos de incentivos e conferências torna‑se um bocadinho mais complicado. Todos nós estamos envolvidos e queremos dar o nosso contributo para que a região não caia como caiu. Na altura dos primeiros incêndios houve milhares de cancelamentos. Toda a gente perdeu o negócio e isso põe em risco postos de trabalho e empresas.