Nos Primavera Sound: O equilíbrio entre a música, as marcas e o meio ambiente

12-06-2017

Entrevista a José Eduardo Martins, sobre a harmonia entre a música, as marcas e o Ambiente no Nos Primavera Sound, que vai estar de volta ao Porto de 7 a 9 de Junho de 2018.

Nas palavras de Bon Iver, o Nos Primavera Sound é “o festival com mais classe do mundo” e a organização tudo faz para conseguir esse título, tentando encontrar sempre um equilíbrio entre a música, as marcas e o meio ambiente. Este trabalho, sempre em constante afinação, vai repetir-se para o ano e as datas da sétima edição do festival já são conhecidas: 7, 8 e 9 de Junho de 2018.

No terceiro dia do evento, que se realizou de 8 a 10 de Junho no Parque da Cidade, o balanço era já positivo. Na sexta-feira, o Nos Primavera Sound tinha registado um recorde de afluência, com 30 mil pessoas no recinto, número que atingiu o que a organização chamou de “limite de conforto”. Presentes no festival estiveram mais de 60 nacionalidades, preparadas para escutar os artistas em cartaz.

Mas, e embora a música seja sempre a prioridade, o Nos Primavera Sound é mais do que isso. É também um desfile de marcas, que ao longo dos três dias fizeram activações para se aproximarem do público, distribuindo lenços, gelados, serviços, aplicações para os telemóveis, lápis com sementes, entre outros brindes. Mas aos festivaleiros chegaram também cinzeiros portáteis e os já conhecidos copos reutilizáveis, já que a ideia é também proteger e cuidar do Ambiente.

A Event Point esteve à conversa com José Eduardo Martins, da direcção da Pic-Nic, para perceber como o Nos Primavera Sound constrói este equilíbrio entre a música, as marcas e o Ambiente.

 

Que relação tem o NOS Primavera Sound com as marcas?

Uma das coisas que faz com que as pessoas achem que este é um festival diferente do paradigma que costumam encontrar é, também, porque as marcas, neste trabalho que fazem connosco, têm uma atitude bastante diferente. Nós procuramos que o consumidor seja atingido só pela sensibilidade no que diz respeito ao posicionamento das marcas e justamente pelo respeito de que isto é – no princípio, no meio e no fim – um evento musical, um evento de programação cultural, em que o centro do que fazemos é a música. Por exemplo, não se ouvem anúncios com som no Primavera Sound, porque a única coisa que nós queremos que as pessoas ouçam quando entram neste recinto é apenas e só o que têm a dizer umas às outras e a música que sai dos palcos. E portanto, as pessoas não recebem publicidade sonora. Nós procuramos que as marcas façam aqui uma abordagem à exposição cuidada e minimalista. Agora já não tanto, mas no princípio sentia que perdíamos dinheiro nos patrocínios por querermos ter um direito de visto e de veto sobre as activações das marcas. Nós só aceitamos patrocínios que nos permitam vetar o tipo de brindes que é distribuído. Por exemplo, nós nunca tivemos um brinde de plástico no Primavera Sound, nunca ninguém aqui recebeu um brinde que vá poluir ou vá fazer danos ao Ambiente. Este prémio do “Sê-lo Verde”, que ganhámos este ano, é resultado da atitude que temos desde o primeiro ano.

 

É uma preocupação…

É uma preocupação desde o primeiro ano. Claro que falamos de cor, porque a nossa programação atrai um público especial. Quer dizer, não se pode ter a pretensão de educar uma massa de 20 ou 30 mil pessoas. Não é isso que acontece. O que acontece é que a programação atrai pessoas que são mais susceptíveis de respeitar um posicionamento mais inteligente por parte das marcas. Depois também procuramos que haja uma harmonia estética em tudo o que se faz. Temos um gestor do recinto, que é artista plástico, o João Paulo Feliciano, que connosco decide boa parte do que aqui acontece. E portanto, não há ovnis caídos do céu no meio do Parque da Cidade, porque isso era desrespeitar o Parque da Cidade do Porto. Acho que se as pessoas vissem um tanque de contentores a espreitar por cima dos palcos não usufruíam isto da mesma maneira e não tinham respeito pela marca que tentasse fazer isso. As marcas aqui distribuem gelados, distribuem brindes úteis. Somos os primeiros a ter copos reutilizáveis e este ano todos receberam um cinzeiro reutilizável. Temos o parque como estava no princípio. E isso dá-nos um selo de qualidade e de conforto que faz com que as marcas sejam completamente parceiras neste tipo de activação.

 

Como é que se constrói esse equilíbrio entre o espaço natural e as marcas?

Eu acho que as marcas começam a perceber que na cabeça de uma geração como esta, os ‘millennials’, e de gente nascida antes, o Ambiente já não é folclore. As pessoas levam mesmo isto a sério. Respeitam mesmo, sentem-se respeitadas e respeitam quem tem este tipo de abordagem. Acho que o tipo de público que nós aqui temos sairia ofendido se lhes dessem martelinhos de plástico ou outras coisas assim do género.

 

A integração das marcas no Ambiente é então uma prioridade, até na forma como o recinto foi pensado…

Essa é uma das prioridades. Mas a primeira prioridade… Nós precisamos das marcas, queremos as marcas, é muito difícil fazer uma coisa destas sem apoios – embora nós sejamos o festival que, na relação marcas-bilheteira, mais vive da bilheteira. O que hoje temos é também um cuidado de ter poucas, de ter marcas que façam uma aposta séria no festival e que queiram estar connosco mais do que um ano, para as pessoas se habituarem a vê-las aqui. E boa parte delas são parceiros desde a primeira hora e isso faz-nos crescer juntos. Mas a nossa primeira prioridade é que isto tudo funcione com a coerência de estarmos a tratar de um evento musical. Antes de mais, isto é um evento onde as pessoas vêm ver concertos; a música é óptima nos palcos e as pessoas, nos mais diversos géneros de música, olham para os palcos com admiração. Tudo o resto não tem de os distrair disso, nem de os agredir. Portanto, queremos é que as marcas não sejam um choque com o banho de cultura que o festival é. Porque senão isso resultaria numa dessintonia que não era boa para as marcas, nem para nós.

 

São poucas marcas e poucas ‘grandes’ marcas. Há também uma aposta nas pequenas empresas, com produtos mais tradicionais, seja no mercado, seja na restauração.

Desde o princípio que isso é bom para nós, as pessoas saberem que vêm a um sítio onde não têm de comer ‘fast food’, mas podem comer a comida tradicional do Porto, em várias versões. Uma das sensações que mais nos orgulha é passar o pórtico do nosso festival e – à direita fica a zona de restauração – sentir o cheiro maravilhoso a sabores portugueses. E ter prazer em comer. É a coerência com a música que pomos no palco. Se as pessoas saírem daqui sem levarem os ouvidos furados de publicidade, sem serem agredidos por brindes de plástico, que vão deitar no caixote do lixo, e se à hora da refeição puderem sentir um paladar delicioso do Porto, tudo isto depois casa bem com a música, com aquilo que nós pomos no palco. E no mercado estão pessoas que fazem parte desta grande movida do Porto. Há ali em cima várias pequeninas coisas que são presentes no Porto e na realidade da Baixa. E como este festival é aqui porque este sítio é especial, essas coisas também fazem parte da nossa experiência.

 

Maria João Leite

 

© Hugo Lima