Os espaços vão ser insuficientes para tantos adiamentos de eventos

11-03-2020

Três organizadores de congressos, ouvidos pela Event Point, relatam os impactos imediatos que o Covid-19 já trouxe à atividade.

O impacto dos cancelamentos e adiamentos de eventos fez-se sentir imediatamente na atividade dos organizadores profissionais de congressos. “O impacto imediato representa muito mais trabalho com os adiamentos dos congressos, porque há que repor toda a logística: encontrar novas datas para encaixar os congressos, disponibilidade e confirmação de palestrantes para as novas datas, negociação com todos os serviços envolvidos”, refere Adelaide Mocho, da Skyros Congressos.

João Paulo Oliveira, da Leading, apelida o impacto de “fortíssimo, para não utilizar já a expressão devastador”. O responsável refere que os eventos programados para os meses de março e abril foram cancelados e a situação é de expectativa para os próximos meses.

A Factor Chave, organizadora especializada em congressos médicos, já conta com sete congressos suspensos ou adiados. As estimativas de prejuízo são enormes. “A situação vivida pela Factor Chave é semelhante à vivida pelas restantes agências da área, com a diferença que ao sermos organizadores exclusivos de eventos da área da saúde os nossos prejuízos são exponenciais”, refere Paula Ferreira de Almeida. Os congressos que se iam realizar em março e abril estão a ser cancelados, situação que está a acontecer na Europa de uma maneira geral, e resta saber se os de maio seguirão o mesmo caminho. Para minorar estes efeitos negativos, Paula Ferreira de Almeida, da Factor Chave, apela à “seriedade, honestidade e transparência” por parte de todos os players.

Adelaide Mocho, da Skyros, sublinha que a maioria dos parceiros “tem sido compreensivo, mas há situações em que não aceitam as alterações e cobram os depósitos (com base nas condições de cancelamento)”. A diretora da Skyros refere que isto traz “um sem número de novas questões para as quais há poucas respostas”. Ainda assim, os adiamentos são preferíveis ao cancelamento, acredita Adelaide Mocho. “Colocando a questão de reduzir o impacto do que está a acontecer podemos dizer que o adiamento dos congressos é o menos mau, o cancelamento seria muito pior. Existem perdas imediatas, desde viagens já emitidas, gráficas, hotéis que não transferem os depósitos, congressistas que não aceitam a nova a data e pedem o reembolso ... um sem número de situações. Mas a não realização dos congressos seria a pior de todas”, sublinha a responsável.

A diretora Comercial da Factor Chave afirma que “até ao momento a grande maioria dos hotéis e venues com que trabalhamos estão a proceder aos novos agendamentos de acordo com as disponibilidades e mantendo os valores muito embora alguns passem de ‘época baixa’ para ‘época média ou alta’; outros há que aplicam novas tarifas ajustadas ainda assim”. Paula Ferreira de Almeida conta que dos sete congressos alterados, em dois estão a ter vários problemas. A diretora apela: “estamos perante uma situação de exceção, esperamos medidas de exceção para podermos todos sobreviver ao Covid-19”.

Incerteza

O futuro é incerto neste momento. “A demora no estado de crise, sem contenção do vírus ou alternativa de tratamento, indiciam um cenário de ainda maior gravidade a curto ou médio prazo”, refere João Paulo Oliveira, indo mais longe, “atrevo-me a dizer que a recuperação pode acontecer no segundo semestre, mas seguramente de forma muito lenta”. O diretor da Leading apela à partilha de informação e indicadores entre todos, porque “podem ser a energia que precisamos para minorar os efeitos do problema”. A diretora da Skyros espera que fique tudo resolvido até junho. “Dificilmente se vão recuperar as perdas deste semestre. As pessoas estão com medo de viajar, de se inscreverem, haverá decréscimo de participantes e consequentemente de serviços”. João Paulo Oliveira concorda, “a recuperação na totalidade parece-nos impossível”. “Primeiro porque alguns eventos perdem o seu calendário de execução, os seus promotores desmobilizam e o cancelamento é inevitável. Depois porque alguns projetos não têm capacidade financeira para serem executados e como consequência não conseguem ser adiados”, isto porque os custos de cancelamento estão a ser muito onerosos. E depois, lembra o diretor da Leading”, se os eventos fossem concentrados no segundo semestre, “a oferta de espaços para a realização é manifestamente insuficiente”. Paula Ferreira de Almeida concorda: “não existirá nem capacidade dos venues, nem disponibilidade dos participantes em participar em eventos todos os dias”.

A responsável da Factor Chave apela a que “o governo assuma uma posição muito clara e inequívoca em dois sentidos: por um lado utilizando o seu poder de influência para forçar aqueles que se querem aproveitar da situação a agir adequadamente e, por outro lado, ajudando as empresas de forma a fornecer uma ajuda muito direta e facilitada a ultrapassar as dificuldades provenientes desta situação, nomeadamente no estabelecimento de uma linha de apoio a tesouraria sem juros e o adiamento ou suspensão do pagamento de alguns impostos, como por exemplo o IVA no primeiro caso e a Segurança Social no segundo caso. “É um momento gravíssimo para um setor que tem puxado a economia nos últimos anos e que tem de ser forçosamente ser ajudado na recuperação”, alerta João Paulo Oliveira, da Leading.

É mais um período crítico em que a resiliência dos organizadores de eventos e congressos vai estar à prova.

 

Cláudia Coutinho de Sousa