Manifesto por um setor em crise

26-05-2021

# tags: Protocolo , Eventos , APOREP

O setor do Protocolo faz parte integrante do ecossistema dos eventos.

Quando a pandemia começou, em 2020, havia muitos técnicos de protocolo a operar em regime de trabalho independente para as grandes empresas de eventos. Mas os sucessivos estados de emergência condenaram esses profissionais a ficar sem trabalho e sem rendimentos. Só os técnicos da administração pública puderam continuar a organizar cerimónias oficiais, de âmbito nacional, regional ou local, respeitando as normas de distanciamento social e segurança sanitária impostas pelas autoridades de Saúde. E os profissionais que trabalhavam em grandes empresas dedicaram‑se a outras tarefas.

Muita gente não se terá apercebido de que em Portugal, em 2020, só foi possível realizar eventos presenciais em condições normais nos primeiros dois meses do ano. Fomos alertados para esta situação dramática pela manifestação impressionante que os profissionais da indústria de eventos fizeram no Terreiro do Paço, a 11 de agosto do ano passado, para chamar a atenção do Governo para a situação desesperada em que se encontravam ao fim de quase seis meses sem trabalhar.

É certo que, no dia seguinte a esta manifestação, a tutela governamental publicou um despacho autorizando a organização de eventos corporativos. Dois meses depois deste balão de oxigénio, na sequência da Declaração do Estado de Calamidade a 14 de outubro, a tutela voltou a proibir os eventos e a animação turística com mais de 10 ou 20 pessoas, nos concelhos de risco (a maioria).

Os espetáculos com centenas de espectadores continuaram a ser permitidos, desde que respeitassem as limitações impostas pela tutela. Como justificar esta diferença de tratamento que afetou a maioria das empresas do setor dos eventos impedindo‑as de trabalhar? Todos sabemos que nos eventos corporativos os participantes respeitam as diretrizes impostas e não assumem comportamentos de risco, ao contrário do que aconteceu em alguns espetáculos que foram notícia na imprensa. Mas ninguém parece ter conseguido explicar à tutela esta diferença entre os dois setores.

Pedro Rodrigues, Diretor Geral da Desafio Global interrogava‑se num artigo da Event Point: “Mas, no fim do dia, quem assume a responsabilidade pela destruição do setor dos eventos em Portugal? É uma questão bombástica e alarmista? É! Mas qual a diferença entre espetáculos e eventos corporativos que justifiquem esta diferença absurda de tratamento dos dois setores? Não havendo uma diferença logística, na atividade de ambos os setores, existe uma falta de confiança nos organizadores de eventos?”Resumindo, o setor dos eventos só funcionou normalmente em janeiro e fevereiro e, de forma reduzida, de 12 de agosto e 14 de outubro. Em Espanha, os eventos nunca foram proibidos, desde que cumprissem as regras rigorosas de segurança sanitária. Os técnicos espanhóis de protocolo continuaram a desenvolver a sua atividade e a auferir os seus vencimentos.

Em Portugal, só as grandes empresas de organização de eventos conseguiram adaptar‑se e produzir eventos virtuais de grande qualidade, os únicos permitidos pelas autoridades. Mas nesses eventos virtuais o protocolo não tem lugar e, por isso, os profissionais independentes de protocolo portugueses só puderam trabalhar durante quatro dos doze meses de 2020. Alguns foram forçados a fechar a atividade nesta área, para minimizar a perda de receitas, outros passaram a trabalhar noutros setores, desperdiçando os conhecimentos que tinham adquirido, e as pequenas empresas fecharam. Muitos sentem‑se defraudados por terem investido em estudos superiores que os conduziram ao desemprego.

Tendo em conta que a tutela, até ao momento [da publicação deste texto], ainda não definiu orientações específicas para a organização de eventos de natureza corporativa, a inquietação persiste. Enquanto as autoridades governamentais responsáveis por este setor não acreditarem que os eventos se podem realizar com as devidas limitações, a discriminação de que os eventos corporativos estão a ser vítimas não vai acabar. Será necessário unirmo‑nos para fazer chegar à tutela as nossas dificuldades em continuar a contribuir para uma indústria nacional que rende ao Estado milhares de euros em impostos.


 

© Isabel Amaral Opinião

Presidente da APorEP - Associação Portuguesa de Estudos de Protocolo

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