Sílvia da Silva: “Eventos são emoções e ligações”

Entrevista

27-02-2023

# tags: Eventos , Vida de Eventos , Conferências

Sílvia da Silva é gestora de projetos e organizadora de conferências e eventos na Veranatura. Embora sempre tenha trabalhado no mesmo segmento, o seu percurso profissional é “bastante diversificado”.

Em 1995, assumiu a direção do departamento de congressos de uma empresa do setor, tendo a seu cargo a coordenação de projetos e o desenvolvimento estratégico do negócio. Depois, durante perto de uma década, dedicou‑se às Relações Exteriores da ANA‑Aeroportos de Portugal, onde organizava eventos e desenvolvia programas e diretrizes para cerimónias oficiais e protocolares.

Entretanto, fundou, em parceria com uma colega da pós‑graduação em Organização de Eventos, Imagem e Protocolo, uma empresa com foco nos eventos corporativos e, mais tarde, iniciou o seu trajeto na Veranatura, onde se encontra desde 2014. “Dentro da meetings industry, trabalhamos maioritariamente a área médica e científica, que é um mundo complexo, único e apaixonante. Não há um dia igual ao outro, mesmo quando os congressos se repetem. É uma atividade vibrante”, frisa.

A grande motivação de Sílvia da Silva está em saber que proporciona “um ambiente de excelência para a discussão de temas de enorme relevância”; ambiente que não passa pelo espaço físico, mas por “contribuir com o meu expertise no desenho de congressos, onde tudo flui, e participar desta forma num objetivo comum e maior, que se traduz em avanços na área da saúde ou inovações tecnológicas”. No fundo, continua, “a promoção de um mundo melhor”.

“Esse ‘é só’ representa muito trabalho e muitas equipas”


Do que mais gosta é de “planificar até à meta, o momento imediatamente após receber uma confirmação ou briefing e em que programo num cronograma todos os passos até ao fecho do congresso”. Numa visão mais ampla, acrescenta que “são as pessoas, as conexões criadas pelas experiências únicas que proporcionamos. Isto é válido para todos com quem me cruzo, seja um cliente, um parceiro ou um participante num congresso”.

“É tão importante a satisfação de um cliente que me parabeniza pelo bom desempenho como testemunhar a alegria de um orador que faz pela primeira vez uma apresentação, perante uma plateia de centenas de participantes – momento que fiz questão de fotografar, oferecendo-lhe depois essa recordação”, explica. E remata: “Eventos são emoções e ligações.”

Por outro lado, gosta menos quando o cliente, “embora inexperiente, quer participar ativamente ou definir tarefas e não valoriza o tempo que estas demoram. Na indústria dos eventos tudo aparenta ser fácil: é só marcar um espaço, um voo, uma refeição, por aí fora... Mas esse ‘é só’ representa muito trabalho e muitas equipas”.

Sílvia da Silva já passou por vários momentos assim. “Recordo‑me de um cliente que me pediu a maquetização de um livro de resumos com centenas de artigos e autores em pouquíssimas horas, dizendo ‘isso é só copy paste!’. Ou outro que não aceitava de todo o valor de uma refeição num hotel de 5 estrelas e insistia em informar‑me o valor do almoço na cantina na faculdade como comparativo. Ou aquele que me disse num sábado ao final da tarde, numa pequena cidade do interior, num evento com 500 participantes: ‘Giro, giro era amanhã oferecer rosas às senhoras.’ Tinha mesmo de ser rosas? Sim. Tinha mesmo de ser no domingo? Sim. Orgulho‑me de ter resolvido estas e mais questões, mas confesso que a frase que mais me irrita é: ‘Tive uma ideia!’”

Momentos marcantes, assustadores e hilariantes


Na lembrança vão ficar para sempre outros momentos mais grandiosos. O evento mais marcante do seu percurso foi o Congresso Europeu de Otorrinolaringologia Pediátrica, evento de grande dimensão, com a participação de 1.700 pessoas, de 60 países, durante quatro dias. “É muito gratificante trabalhar na organização de um evento com esta dimensão, que sabemos que impacta a vida de milhares de pessoas e mais uma: a nossa. O nível de energia que se dedica é avassalador, pelo que é fundamental uma excelente gestão do tempo. Existe uma data e uma hora em que tudo começa; essa meta só é alcançada por quem sabe o que são efetivamente prioridades e consegue distinguir entre o que gostaria de fazer e o que tem de ser feito. Foram dois anos a preparar quatro dias.”

Sílvia da Silva recorda também a assinatura de um acordo de geminação entre duas entidades portuguesa e chinesa, um tipo de evento que, por norma, se reveste de uma “enorme sensibilidade” e que tem de ser planificado “ao mais ínfimo detalhe”.

“Quando se dá o encontro de duas culturas tão díspares (ocidental e oriental), não basta possuir uma sensibilidade apurada; temos de nos apoiar nas regras de relações internacionais, no enorme respeito mútuo e na diplomacia para que nada falhe”, adianta.

Na memória ficam também momentos difíceis, “como a opção de realização de um evento num centro de congressos ainda em construção (decisão imposta pelo cliente), cuja data de conclusão e entrega de obra derrapou literalmente até à véspera do congresso. Mais do que podia não ter corrido bem, podia não ter corrido de todo”.

E momentos assustadores, “como o de um gangue de assaltantes que atuou de forma concertada em Lisboa e, no mesmo dia, se infiltrou em vários congressos, apesar de todas as medidas de segurança vigentes, para furtar telemóveis e computadores. O congresso foi interrompido e o resto do dia foi uma verdadeira sessão policial”.

Mas ficam também momentos hilariantes. Sílvia da Silva recorda uma reunião com uma forte componente protocolar, à qual, à última da hora, faltou um dos participantes, facto que a organizadora só soube momentos antes de todos entrarem para a reunião. “Como sabemos não basta tirar um cartão da mesa; dependendo de quem é, tudo muda. Foi o caso.”

Depois de recolhidos os cartões, Sílvia da Silva refez mentalmente todo o protocolo de mesa, até que entra o presidente e restante comitiva. “Olhou para mim e exclamou: ‘Desculpe, não me lembrei de a avisar. E agora?’; ‘Hoje é free seating’, respondi eu, empoderada, cheia de assertividade, cartões na mão e a esperança que corresse bem. Ele replicou: ‘Destas reuniões é que eu gosto!’. Foi a gargalhada geral e um início de reunião com boa disposição”, conclui.

© Maria João Leite Redação