Turismo: o “salto qualitativo” que se impõe

18-11-2019

Augusto Mateus apresentou a sessão "Turismo: opções estratégicas", no decorrer do 45º Congresso da APAVT.

O turismo é um grande fenómeno global, o crescimento é contínuo, e Portugal tem mostrado um dinamismo crescente. A conjuntura é favorável e por isso seria importante para o país dar um “salto qualitativo” no turismo, sem medo de apostar em mercados mais longínquos. Foi esta a ideia deixada por Augusto Mateus, antigo ministro da Economia e consultor estratégico da Ernest & Young – Augusto Mateus & Associados, na sessão “Turismo: opções estratégicas”, que também deu tema ao congresso da APAVT, que decorre no Funchal.

“Se não dermos um salto qualitativo no turismo, não vamos passar muito mal, mas não vamos aproveitar a oportunidade”, frisou Augusto Mateus, que apresentou passos para transformar as vantagens comparativas em vantagens competitivas. “Uma estratégia eficaz de desenvolvimento do turismo em Portugal e nas suas regiões exige um esforço coerente de promoção conjunta da atratividade territorial e da competitividade  empresarial, no qual sejam fortemente priorizados o reequilíbrio da oferta, nomeadamente ao nível do alojamento, a qualificação do capital humano e a melhoria do nível de serviço, quer no que toca ao núcleo duro dos agentes turísticos (hotelaria, agências de viagens, restauração, operadores de transportes), quer no que toca aos múltiplos agentes que se vão tornando cada vez mais relevantes com o alargamento e densificação dos produtos e experiências turísticas”, lê-se no documento ‘Ganhar o turismo para o país, ganhar o país para o turismo’, coordenado por Augusto Mateus.

Outros processos passam por alargar e aprofundar a fronteira das vantagens competitivas, respondendo ao dinamismo da procura dos mercados emissores, por expandir a capacidade crítica dos destinos – “nem todos os destinos têm aptidão turística” –, e por dotar os destinos de meios para acompanharem de forma dinâmica as tendências globais da procura. E estas passam pela contínua expansão da classe média mundial, pelo envelhecimento mundial, pela afirmação dos estratos demográficos mais jovens como os principais consumidores de turismo, pelo aumento dos movimentos migratórios e férias mais repartidas e pela procura de soluções de turismo ambiental e socialmente sustentáveis. Para ir ao encontro destas tendências é preciso ter quatro fatores em conta: o digital, a sustentabilidade ambiental, a mobilidade e a segurança.

 

“Uma oportunidade que temos de aproveitar”

“As viagens são o grande fenómeno da globalização”, disse Augusto Mateus. O turismo aumenta em todo o mundo e, no próximo ano, o número de turistas à escala mundial deverá chegar aos 1.500 milhões, “enquanto que em 1950 era de 25 milhões”.  O turismo cresceu, na última década, 4% ao ano, tanto em termos de turistas como de receitas. “Isto mudou o mundo.”

Dados apresentados por Augusto Mateus indicam que a Europa continua a ser a principal região emissora, mas a sua importância começa a diminuir pelo crescimento do mercado asiático. A região Ásia-Pacífico afirma-se como a região emissora mais dinâmica, destacando-se também como um mercado recetor dinâmico. Na Europa, Portugal é o quarto país com maior crescimento e Lisboa foi a região que mais contribuiu para o crescimento do turismo, com três milhões de novos hóspedes e oito milhões de novas dormidas. No entanto, neste departamento das dormidas, o Algarve mantém-se como a região mais relevante.

Em 2018, no turismo inbound, o número total de hóspedes foi de 25,2 milhões, sendo 9,9 milhões de mercado doméstico e 15,3 milhões de mercado internacional. O número de dormidas foi de 67,7 milhões (19,9 milhões de mercado doméstico e 47,8 milhões do mercado internacional). Tudo resultando em receitas de 16,6 mil milhões de euros. No turismo outbound, o número de hóspedes foi de 1,4 milhões e o número de dormidas foi de 2,3 milhões, com receitas no valor de 4,7 mil milhões de euros. Em dez anos, comparando com os dados de 2008, o número de hóspedes e de dormidas tornou-se 88% e 72% superior. “A evolução recente tem a ver com a alteração das estruturas. Há uma redução significativa do turismo de estada longa e um aumento significativo da estada curta, e isso dá mais receita”, explicou.

No turismo inbound, Portugal continua concentrado nos mercados de proximidade. Reino Unido, Alemanha, Espanha e França lideram a tabela dos dez países emissores de turistas, que representam cerca de 76% do total de chegadas. Desta lista fazem também parte o Brasil, os Países Baixos, os Estados Unidos, a Irlanda, a Itália e a Bélgica. “Os principais mercados emissores são decisivos, mas têm de se tornar menos decisivos”, alertou Augusto Mateus, sublinhando a necessidade de um salto qualitativo e da aposta em novos mercados, chamando a atenção para os mercados longínquos, como o asiático, que está em crescimento. “Esta é uma oportunidade que temos de aproveitar.”

Para Augusto Mateus, “o turismo português vive de identidade, vive da diferenciação”. E é necessário que os portugueses entendam os benefícios do turismo e que não os vejam como obstáculos. “Se nós formos bons então vamos fazer a hora, não vamos ficar à espera que aconteça bem”, afirmou.

 

Os benefícios e os efeitos negativos associados ao turismo

De acordo com Augusto Mateus, os benefícios associados ao turismo são a valorização, proteção e financiamento da recuperação e desenvolvimento do património natural, histórico e cultural; a dinamização do investimento em reabilitação urbana (privada e espaço público) e a revitalização dos centros históricos; atração de novas empresas e modelos de negócio; e a afirmação do cosmopolitismo.

Por outro lado, como efeitos adversos do ritmo de crescimento do turismo, o economista destacou os impactos ambientais negativos e a degradação do espaço público; a pressão sobre o custo de vida e o preço relativo de certos ativos; o congestionamento das principais zonas de atração turística; a segmentação dos empregos gerados com áreas significativas de precaridade ou intermitência; e a possibilidade de agravamento das disparidades regionais.

 

Maria João Leite*

*Viajou para o Funchal a convite da APAVT